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Luís Paulo Rodrigues 09/07/2020 - Sobre os perigos que o “i-voting” traz ao Sporting



Sobre os perigos que o “i-voting” traz ao Sporting


O Sporting Clube de Portugal foi fundado para ser tão grande como os maiores da Europa. Infelizmente, os atuais dirigentes fazem tábua rasa dessa máxima centenária evocada por José Alvalade.


A questão é que se considerassem o SCP um clube tão grande como o Barcelona, por exemplo – cujos associados, há poucos meses, chumbaram a introdução de um sistema de votação pela Internet –, jamais as cabeças pensantes de Alvalade tirariam da cartola uma proposta de mudança de estatutos destinada a mudar o sistema de votações, deixando de ser presencial para passar a ser pela Internet.


Para que os sportinguistas fiquem devidamente esclarecidos, não se trata de substituir o voto presencial em papel pelo voto presencial eletrónico. Trata-se de substituir o voto presencial por um voto que pode ser exercido em qualquer lugar – com o falacioso argumento da comodidade e da participação de todos –, bastando uma ligação à Internet, e dispensando qualquer debate, nomeadamente na assembleia geral – o parlamento de uma coletividade desportiva.


Avisados, os sócios do grande Barcelona decidiram recentemente chumbar o “i-voting”. E se o Barcelona chumbou o “i-voting”, o Sporting também deve chumbá-lo. Desde logo porque os bons exemplos devem ser seguidos.



FREDERICO VARANDAS NÃO PROMETEU


Creio que foi o vice-presidente Francisco Salgado Zenha – aquele rapaz que procura dar o ar de homem de contas certas que fez gala de ter enganado os ingleses do Manchester United na venda de Bruno Fernandes – que há tempos afirmou que o Sporting era o clube da “roulotte”, para dar a ideia de um alegado atraso organizacional deixado por Bruno de Carvalho, em especial pelo défice de folhas de Excel e outro “software”.


Ora, como mudança estrutural na vida associativa sportinguista, escolheram introduzir a questão do voto pela Internet – eufemisticamente apresentado como “i-voting”, para que ninguém perceba o que está em causa – como se os problemas do SCP tivessem a ver com a forma como os sportinguistas votam.


Mais a mais, estamos perante um tema que não fez parte do programa eleitoral da candidatura “Unir o Sporting”, de Frederico Varandas. O que ele prometeu foi o alargamento da votação aos núcleos. Agora, ao propor a introdução do “i-voting” está a fazer algo diferente daquilo que prometeu, enganando, assim, os associados.


A covid-19 serviu para adiar a Assembleia Geral de análise, debate e votação do orçamento da próxima época desportiva, mas não foi obstáculo para criar uma comissão de dirigentes para produzir uma proposta de alteração de estatutos.


Por falar na comissão de Rogério Alves, registo que seja um grupo em circuito fechado, sem envolvimento de outros sportinguistas, a começar por ex-dirigentes que são referências de trabalho e conhecimento do clube e do seu funcionamento.


É pena que Rogério Alves tenha criado uma comissão que revela um Sporting cada vez mais fechado sobre si próprio. Tanto mais que, num clube fortemente dividido, seria aconselhável uma comissão agregadora, com representantes de outras sensibilidades.


Em matéria de alteração de estatutos não pode haver brunistas, nem varandistas. Tem de haver sportinguistas e, sobretudo, tem de haver Sporting Clube de Portugal!...


O I-VOTING NA ESTÓNIA


O voto pela Internet é uma questão demasiado séria para o futuro do SCP para ser tratada com leviandade e com pressa.


A Estónia foi talvez o primeiro e único país europeu a implementar o voto pela Internet em eleições políticas. Porém, 15 anos depois, o processo ainda não chegou a toda a população eleitoral, que é na ordem dos 560 mil eleitores.


Mas não é um processo fácil, ainda que cada eleitor só valha um voto (o que não acontece no Sporting Clube de Portugal, cujos sócios-eleitores têm direito a quantidades diferentes de votos em função da antiguidade – este sim, um problema que merecia uma análise séria tendo em vista uma alteração estatutária para uma maior democraticidade no clube).


Na Estónia, o “i-voting” acontece entre o 10º e o 4º dia antes da votação nas urnas físicas. Ao longo destes dias, o eleitor pode mudar o seu voto mais do que uma vez, sendo que contará para registo a última votação feita. No dia eleitoral não é possível fazer a votação online.


Por questões de segurança, os eleitores estónios descarregam um programa específico para os seus computadores, que faz uma análise na máquina para detetar se há a presença de algum software malicioso que possa viciar a votação.


Se esta questão fosse cumprida nas eleições leoninas, cada associado teria de possuir um computador pessoal. Duvido que seja possível.


Voltando à Estónia, também é necessário que o votante pela Internet faça uma verificação através do bilhete de identidade ou um certificado digital que ateste a identidade da pessoa. O voto é depois encriptado e enviado para um servidor, juntamente com um carimbo temporal.


Estes cuidados são imprescindíveis, porque o voto pela Internet não é totalmente seguro, uma vez que o sistema de votação, dependendo da tecnologia, pode ser viciado por eventual intervenção humana suscetível de alterar a escolha dos eleitores.


No caso do Sporting Clube de Portugal, em que o número de votos de um associado tem uma relação direta com a sua antiguidade, o voto eletrónico dos sócios idosos (que têm um peso eleitoral maior) pode ser facilmente manipulado por terceiros que sejam chamados a ajudar no ato de votar, dada a natural iliteracia digital das pessoas idosas.


O QUE ROGÉRIO ALVES TERÁ DE EXPLICAR


Para ser bem-sucedido e para que os resultados não ofereçam dúvidas, o voto pela Internet tem de ser feito através de um sistema totalmente confiável.


Antes de colocar a sua proposta de alteração de estatutos à votação dos sócios, Rogério Alves tem de explicar como é que os sportinguistas podem ter a certeza de tudo o que se passará com o seu voto, ou os seus votos, em espaço digital, sem que seja posto em causa o segredo desses votos. É claro que isso levanta dúvidas e complicações.


Para existir transparência e para os sportinguistas confiarem na solução, é preciso que seja possível auditar o sistema de votação pela Internet, o que, necessariamente, terá de ser feito por uma organização independente.


Por isso, ao apresentar a sua proposta de alteração de estatutos, a comissão de Rogério Alves também terá de informar os sportinguistas como é que o sistema de voto pela Internet poderá ser auditado, e por quem, e quando é que isso custará ao clube em cada votação.

Por outro lado, não existe nenhum estudo que comprove que a introdução do voto eletrónico faria aumentar a participação dos sportinguistas nas assembleias gerais eleitorais.


O argumento segundo o qual o voto pela Internet permitirá uma muito mais ampla e regular participação dos sócios do SCP na vida do clube, uma vez que que possibilitaria o voto quando o sócio quisesse e onde estivesse, é falacioso.


O que me parece é que Rogério Alves quer assembleias gerais mansas e cordiais, com meia dúzia de gatos pingados e obedientes, fomentando uma relação fria, distante e desapaixonada entre os associados e o seu clube, remetendo o sócio para o papel de mero cliente pagador de quotas.

Filipe Soares Franco foi o primeiro presidente a falar no associado como um cliente do clube, e Rogério Alves já lá estava, como presidente da assembleia geral, a caucionar a ideia.


Felizmente, a maioria dos sportinguistas move-se pelo seu amor e pela sua paixão ao clube. Só assim se mantém firme e forte, mesmo sem ganhar o campeonato de futebol há 18 anos.


A participação dos sportinguistas na vida do clube é, portanto, uma falsa questão. Se há em Portugal um clube em que os sócios participam ativamente nas suas decisões esse clube é o Sporting Clube de Portugal, como demonstram presenças de milhares de pessoas nas últimas assembleias gerais realizadas, eleitorais ou não eleitorais.



VOTAÇÃO PRESENCIAL EM TODO O PAÍS


O caminho que me parece mais consistente, que já estava a ser traçado antes de 2018, e que foi prometido no programa eleitoral de Frederico Varandas, será alargar o voto presencial aos núcleos leoninos espalhados pelo país, de forma gradual, até ser possível que cada sócio do Sporting Clube de Portugal que resida fora do município de Lisboa possa exercer o seu direito de voto no seu núcleo – ou num dos núcleos do seu distrito –, num processo eleitoral transparente, confiável e seguro, com cadernos eleitorais atualizados com antecedência, com delegados de todas as listas presentes no ato eleitoral, escrutinando todo o processo.


O voto presencial descentralizado nos núcleos leoninos – em urna ou mediante um sistema de votação eletrónico – teria também a vantagem de reafirmar a força e a implantação nacional do Sporting Clube de Portugal. E cada ato eleitoral seria uma oportunidade de afirmação nacional da marca Sporting Clube de Portugal, potenciando a captação de novos associados, e evidenciaria a importância dos núcleos como frentes de proximidade do SCP em todo o território nacional. Cada sócio, de Bragança a Faro e de Castelo Branco à Madeira e aos Açores sentiria a importância do seu voto na vida do SCP.


A votação presencial descentralizada, em papel ou eletrónica, devidamente escrutinada, com mecanismos de controlo que não ofereçam dúvidas, seria um processo transparente, confiável e seguro, que reforçaria a democracia no Sporting Clube de Portugal.



Luís Paulo Rodrigues

09/07/2020


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