Foi notícia esta semana a contenda entre Sporting e Sampdoria devido à transferência de Bruno Fernandes para o Manchester United. Decidi, por uma questão de princípio, não falar do triângulo Sporting–Sampdoria–Bruno Fernandes. Vou antes recordar o triângulo Lokomotiv–Nika–Glushakov.
Reza a história que em Dezembro de 2005, o Lokomotiv adquiriu os direitos desportivos do jogador Denis Glushakov ao FK Nika pelo valor de 300 mil dólares e com a contrapartida de pagar a este clube 15% do valor de uma futura transferência. Nos primeiros cinco meses, Glushakov não vestiu a camisola do Lokomotiv. Perante esta situação, o Lokomotiv cessou o vínculo com o jogador, em Junho de 2006, que viria a assinar pelo SKA Rostov. Em Novembro de 2006, Glushakov denunciou o contrato de trabalho com o SKA Rostov e assinou, no dia seguinte, novamente com o Lokomotiv. Em Fevereiro de 2007, o jogador foi formalmente emprestado ao Zvezda Irkutsk e regressou ao Lokomotiv em Dezembro desse ano, impondo-se, finalmente, no clube e jogando até ao final da temporada 2012/13. Nesta altura, o Lokomotiv alienou os direitos desportivos de Glushakov ao Spartak de Moscovo por 8 milhões de euros e o FK Nika exige de imediato os 15% a que teria direito. O Lokomotiv rejeitou pagar o valor devido e, após condenação pela Federação Russa e confirmação em sede de recurso, o clube russo solicitou a intervenção do Tribunal Arbitral do Desporto (TAS).
O TAS confirmou boa parte das decisões anteriores, incluindo a obrigação de pagar 15% dos 8 milhões de euros recebidos pela transferência do Lokomotiv para o Spartak. A razão? A dispensa do jogador e a posterior assinatura de contrato com o SKA Rostov foi, na verdade, uma simulação que visava ocultar um empréstimo. Portanto, apesar de o jogador assinar um novo contrato com o Lokomotiv, o vínculo efectivo com a casa mãe nunca terminou e só conta a transferência para o Spartak para efeitos de determinação do valor a dever ao FK Nika. O mais importante a retirar deste caso prende-se com a decisão dos árbitros do TAS de condenar o Lokomotiv por um acto que o próprio clube provocou. Ou seja, mesmo havendo dois contratos celebrados com o jogador em alturas distintas, foi uma acção do clube moscovita a provocar o facto que o viria a colocar em posição de se eximir ao cumprimento de uma cláusula. Tivesse sido um facto externo, fora do controlo do Lokomotiv, e a solução teria sido diferente. Aqui, imaginemos, por exemplo, que tinha ocorrido um sismo com um impacto brutal na região de Moscovo e que, por qualquer razão, impediria todos os clubes da capital de participarem na liga russa por tempo indeterminado. Os jogadores, na necessidade de acautelarem o seu futuro desportivo ver-se-iam forçados a prosseguir a sua carreira noutros clubes e, quando a normalidade fosse retomada, assumiriam novo compromisso com os clubes respectivos. Nestas circunstâncias, o Lokomotiv não tinha o controlo (nem tiraria benefícios) da situação que determinou a saída do jogador e a celebração de um novo contrato. Agora imaginemos que o Lokomotiv tinha sido condenado pela rescisão unilateral de um seu jogador e que, em consequência disso, se viu na obrigação de recuperá-lo para não dar um activo como perdido. E imaginemos ainda que o clube não é condenado mas reconhece tacitamente a sua culpa ao propor um novo contrato que, de alguma forma, o compense. Imaginemos ainda, por hipótese, que o jogador foi convencido a rescindir unilateralmente como forma de pressionar a direcção a sair e dar lugar a pessoas que incentivaram o jogador a rescindir e viriam a trabalhar com pessoas que participaram no incentivo à rescisão. Parece-me que em qualquer uma destas hipóteses o clube em causa não pode tirar partido de circunstâncias que o próprio clube causou e tentar, com isso, eximir-se ao cumprimento de uma obrigação para com um terceiro. Isto seria, na linguagem jurídica tradicional, puro abuso de direito. E nenhuma destas situações é sequer comparável com a rescisão de Seydou Keita para rumar do Sevilha para o Barcelona, já que, neste caso, o Sevilha não tinha faltado ao cumprimento de qualquer dever para com o atleta: além de o vínculo ser sempre o mesmo desde a transferência do jogador, este apenas decidiu prosseguir a sua carreira noutro clube e cumpriu a exigência contratualizada com o pagamento da cláusula de rescisão. Não houve qualquer comportamento culposo do Sevilha. Há indemnização e não transferência. Entender que um jogador poderia rescindir com um clube por culpa deste e assinar depois um segundo contrato sem qualquer transferência efectiva pelo meio seria abrir a porta a que sempre que um jogador renovar contrato pelo seu clube – assinando, portanto, um segundo e novo contrato – teria, na verdade, um novo vínculo que, por isso mesmo, anularia quaisquer direitos do clube anterior. O TAS já discutiu o conceito de "transferência" e esse não parece passar pela rescisão unilateral e assinatura de novo contrato.
Perante isto, impõe-se a pergunta: alguém conseguiria imaginar contratos de venda dos direitos desportivos de jogadores com cláusulas de mais valias ou de comissões por vendas futuras?
Alexandre Guerreiro
09/05/2020
Obrigado Alexandre.
A verdade é como o azeite na água, pode misturar-se mas o azeite vem sempre à superfície.
O que é certo é que o burro fernandes, sempre teve a cara de ratazana que na realidade é.
Que vá pela sombra, porque a m**** so sol derrete.
O mesmo que foi ao TAD defender rafael leão contra o SCP, quer agora envergonhar mais o clube, não pagando o que a Sampdoria tem direito.
Gente sem escrúpulos, palavra, princípios, a fina flor do entulho da sociedade.
Está gente não é Sportinguista, são no máximo sportingados vigaristas, proxenetas e aldrabões.
#varandasout
#cRoquettesout
#OSPORTINGÉDOSSÓCIOS
#cRoquetteescutaésumfdp
SL
Brilhante como sempre, isento mais do que nunca. Que bom contar com esta presença no Dr AG neste site, cada vez mais rico. Continuação de sucesso para todos os intervenientes. Sporting Sempre. Bruno de Carvalho e Alexandre Godinho, seguimos juntos rumo ao sonho! 💚
um trafulha, será sempre um trafulha.
Mto bom. Parabéns Dr Alexandre. Saudações
Pois , está na cara que não haverá muitas hipóteses de ter uma decisão favorável sobre estes 10% de mais valia do BF. Seria abrir um precedente que eliminaria esse tipo de cláusulas em contratos de venda futuros.... Provavelmente ainda pagaremos a advogados por uma defesa sem sentido.... Não deixa ser curioso a forma como a imprensa " amiga " de varandas e deste frágil SCP, apresentou esta notícia, colocando em letras grandes que " SCP tenta/quer poupar" 4,6 milhões de euros , quase enaltecendo o mérito e a lógica desta atitude . Obrigado pelo bom esclarecimento como habitual e na próxima sexta feira , estarei para ouvir a sua participação ,no comentário com assinatura.